domingo, 13 de abril de 2008

Pablo Neruda [adaptado]

Morre lentamente quem não viaja
. sendo que as unicas viagens duram cerca de 30 minutos, entao estou a morrer

Quem não lê,
. sendo que estou há mais de um ano para acabar um livro, entao estou a morrer

Quem não ouve música,
. sendo que a musica que eu oiço nao me faz crescer mentalmente, entao estou a morrer

Quem não encontra graça em si mesmo.
. sendo que nao me acho nada de especial, entao estou a morrer

Morre lentamente,
Quem destrói seu amor próprio,
. sendo que nunca tive muito, entao estou a morrer

Quem não se deixa ajudar.
.sendo que sempre disse que nunca precisei de ninguem, entao estou a morrer

Morre lentamente,
Quem se transforma em escravo do hábito,
Repetindo todos os dias os mesmos trajectos,
.sendo que nao tenho coragem de arriscar em ir por sitios que nao conheco, entao estou a morrer

Quem não muda de marca,
.sendo que sou extremamente teimosa para mudar qualquer coisa que seja, entao estou a morrer

Não se arrisca a vestir uma nova cor,
. sendo que nao posso vestir uma cor qualquer porque ela pode nao me favorecer, entao estou a morrer

Ou não conversa com quem não conhece.
. sendo que so converso com quem nao conheco quando já nao estou no meu estado normal, entao estou a morrer

Morre lentamente,
Quem evita uma paixão e seu redemoinho de emoções,
Justamente as que resgatam o brilho dos olhos,
E os corações aos tropeços.
.sendo que estou desde há muito tempo sem acreditar no amor e todos os sentimentos estupidos que traz com ele, entao estou a morrer

Morre lentamente,
Quem não vira a mesa quando está infeliz,
Com o seu trabalho, ou amor,
.sendo que nunca irei ir virar a mesa porque terei que limpar tudo o que deitei ao chao, entao estou a morrer

Quem não arrisca o certo pelo incerto,
Para ir atrás de um sonho,
.sendo que tenho em mim uma preguiça enorme que nao me deixa ir atras de nada, esperando sempre que as coisas venham ate mim, entao estou a morrer

Quem não se permite,
Pelo menos uma vez na vida,
Fugir dos conselhos sensatos…
.sendo que nenhum dos conselhos que me dao parecem resultar, entao estou a morrer




Contudo, o que vale é que estou a morrer mas...

é lentamente.

sábado, 5 de abril de 2008

fernando pessoa

Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não ?

Não sei.
Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido.
Mas tão de leve !...

Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há muita coisa
Incompreendida...

Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
'Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço ?

Como se tu,
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.

Assim a brisa
Nos ramos diz
Sem o saber
Uma imprecisa
Coisa feliz.